A Prefeitura do Rio de Janeiro, da gestão Marcelo Crivella (Republicanos), começou a distribuir máscaras descartáveis de papelão nas ruas para evitar a contaminação pelo novo coronavírus nesta semana, o que causou indignação nas redes sociais. O item consiste em uma cartolina branca dobrável, que acompanha o formato da boca e do nariz, com dois elásticos nas pontas. “Essa máscara não é recomendada para uso hospitalar ou profissional da saúde”, diz um aviso abaixo do logo azul da Secretaria Municipal de Ordem Pública. Um agente comunitário publicou uma foto usando o produto e escreveu que antes achava que era brincadeira, chamando a iniciativa de absurda. Uma mulher que ganhou duas máscaras respondeu que “só rindo”. Outra brincou que, ou os pobres morrem por falta de respirador, ou sufocados com a máscara de papelão. Nesta terça (5), o secretário da pasta, Gutemberg Fonseca, gravou um vídeo defendendo a eficácia do produto e dizendo que ele tem autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Ele afirma que ela pode ser usada por até quatro horas, enquanto a máscara mais tradicional, de TNT, dura duas horas. Para demonstrar, ele aplica um desodorante aerosol no item feito de TNT. “Você vê que sai aqui do outro lado”, diz. Depois, epirra o mesmo produto no item feito de papelão. “A celulose já não deixa passar”, compara. Questionada, a Anvisa não respondeu se o papel é ou não eficaz contra a transmissão do vírus, mas afirmou que não valida máscaras para uso doméstico, apenas para os serviços de saúde. A agência disse ainda que, desde uma resolução publicada em 23 de março, empresas e instituições estão temporariamente dispensadas de autorização para a fabricação de máscaras, desde que sigam critérios técnicos. “O fabricante é o responsável por assegurar a eficácia e segurança do produto”, diz. Sobre as máscaras, essa norma diz: “As máscaras cirúrgicas devem ser confeccionadas em material Tecido Não Tecido (TNT) para uso odonto-médico-hospitalar, possuir, no mínimo, uma camada interna e uma camada externa e, obrigatoriamente, um elemento filtrante, de forma a atender aos requisitos estabelecidos”. Após a prefeitura ser questionada, o secretário Gutemberg Fonseca entrou em contato com a reportagem. Ele repetiu que a máscara é eficaz e ajuda a salvar vidas. “Entre ter a opção de salvar vidas e a opção de deixar a pessoa morrer, você fica com qual opção?”, declarou. “Lógico que funciona, senão a gente não estava usando. Tudo que a gente faz passa pelo nosso conselho científico. Todas as medidas passam pela ciência antes, pelo nosso grupo de médicos”, disse, sem detalhar a aprovação da Anvisa que havia citado na internet. Ele argumentou que há certas regiões onde as pessoas não têm nem o que comer, portanto não conseguiriam fazer suas próprias máscaras. “Uma pessoa precisa se locomover e não tem máscara, e aí é impedida de entrar no ônibus. Isso [a máscara de papelão] não ajuda?”, perguntou. Produtos parecidos, feitos de papel cartão plastificado, também causaram polêmica em São Vicente, litoral de São Paulo, nos últimos dias. Ao anunciar a medida em um vídeo nas redes sociais, o prefeito da cidade, Pedro Gouvêa, se enrolou e acabou encobrindo todo o rosto. Depois, o município afirmou que o item serve para casos em que o cidadão precisa usar a proteção convencioal, mas não a tem naquele momento. Um estudo publicado em 17 de março na revista científica New England Journal of Medicine relatou que o novo coronavírus pode permanecer no papelão por até três dias, ainda que em quantidades muito pequenas. Uma carga viral mais perigosa foi detectada em até oito horas após o início do experimento. É um tempo maior que o do ar (três horas) e do cobre (quatro horas), mas menor que o do plástico e do aço inoxidável (24 horas). Os cientistas afirmam que os resultados ainda são muito iniciais e não são definitivos, mas oferecem um parâmetro para estabelecer cuidados básicos com a limpeza.