“Plantando e pensando,” relato de um araciense sobre o momento de pandemia

12/04/2020 04:12 • 4m de leitura

Durante este período de isolamento social, fui uns dias ajudar um irmão a plantar feijão e milho, em uma pequena propriedade dele. Enquanto plantava, ia pensando sobre essa situação na qual estamos vivendo e me lembrei de que, quando eu era criança e morava na roça com toda minha família, em nossa casa havia três latas de zinco, de cerca de três metros de altura, em um quarto exclusivo. Elas sempre estavam cheias. Uma era de feijão, outra de farinha e uma última de milho. Ainda tinha um tambor menor (desses que se coloca água em uma carroça) que guardava o amendoim. Enquanto moramos lá, não me lembro de ver nenhuma delas vazia. Era o que produzíamos em nossa propriedade e meu pai armazenava. Graças a Deus, faltavam outras coisas não tão essenciais,
mas comida nunca nos faltava.

Imagens retirada do Google Imagens

A preocupação, portanto, há cerca de 40 anos, era armazenar alimentos! Lembro que meu pai vinha à cidade, semanalmente, apenas para fazer uma pequena feira de alguns poucos alimentos, como café, açúcar, alguns pães e biscoitos. Nossa propriedade era pequena, mas lá tínhamos praticamente todos os alimentos necessários, além desses que eram guardados nas grandes latas. Lá, tínhamos ovos, leite, verduras e legumes (que minha mãe produzia em uma pequena
horta), a carne de carneiro (e seus derivados) e, às vezes, galinha caipira, sempre que recebíamos visita! Voltando às latas de zinco, o que quero dizer aqui é que a preocupação das famílias em estocar alimentos deixou de existir faz muito tempo. As pessoas passaram a se preocupar em guardar dinheiro. Então, diante dessa situação atual, durante meus pensamentos enquanto plantava, comecei a perceber o quão cruel é o Sistema no qual vivemos! Atualmente, quem não tem um real no bolso ou no Banco não tem como comer um ovo! Até mesmo quem tem dinheiro no Banco, se não tiver o produto para comprar, vai passar fome! Então, o que é mais importante: o dinheiro ou o alimento? É o que estamos, infelizmente, vivenciando no mundo presente! O pobre está passando fome porque não é ele próprio quem produz seu alimento! O rico também pode passar fome, a qualquer
momento, se acabar a produção de alimentos! Afinal, ninguém come cédulas de papel nem moedas! Dessa forma, a classe mais importante no mundo, nesse momento, sem dúvidas, é o agricultor/produtor rural! Por mais que os grandes empresários tenham seus latifúndios com grandes
plantações, a monocultura não resolve a fome do mundo, pois ninguém sobrevive só comendo feijão puro, ou só comendo arroz, por exemplo!
Portanto, é imprescindível que, após essa crise mundial, o homem do campo seja mais valorizado, que receba incentivos para continuar produzindo e, principalmente, que ele e sua família continue vivendo do campo e no campo. É essencial investir em Educação do Campo, para incentivar a juventude rural a estudar para continuar no campo, produzir e viver do campo. Como quase ninguém quer mais viver no campo, muito poucos ainda trabalham na zona rural, é necessário que, em caráter de urgência, o Governo crie mecanismos de geração de emprego ou, pelo
menos, uma forma de cada família brasileira que não tenha renda alguma, possa receber uma “renda mínima”, para não morrer de fome na cidade!
O isolamento social nos fez perceber (ou nos lembrar!) que há milhões de famílias brasileiras que dependem de alguma geração de renda para conseguirem, diariamente, algum dinheiro para, pelo menos, se alimentarem, uma vez que, diferentemente de como minha família vivia há anos atrás, não produzem alimento nenhum! E esse é um grande problema para a humanidade!

Jean Márcio de Oliveira – Professor

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