“Hoje 95% do agave do sisal é jogado fora,” diz pesquisador da Unicamp

14/04/2023 10:36 • 4m de leitura

O pesquisador da Unicamp (Universidade em Campinas), Gonçalo Pereira afirmou que atualmente a maior parcela do sisal fica inutilizável. “Somente uma parte decimal das folhas é aproveitada. Da biomassa, 95% do agave do sisal são jogados fora. Se a gente utilizasse todo o bagaço do sisal para gerar energia, naquela região toda da Bahia não precisava nem de diesel, nem de gás de cozinha”, destaca o coordenador do Laboratório de Genômica e Bioenergia da Unicamp. Segundo Pereira, do agave pode se aproveitar tudo: além do etanol, fibras, silagem, nanocelulose, inseticida e carvão vegetal (biochar), que funciona como fertilizante do solo. “O ciclo do agave exige planejamento e paciência. Leva de três a cinco anos até a primeira colheita. Até lá, a planta vai juntando forças e ganhando porte. No quinto ano, a produção atinge 880 toneladas por hectare. Um rendimento equiparável ao da cana-de-açúcar, quando distribuído ao longo do ciclo. Por que, então, o México, terra-mãe da agave tequilana, não aproveita todo seu potencial energético? Segundo Pereira, porque, por lá, os olhos estão todos voltados para a tequila, que alcança um elevado preço de mercado. Com 374 milhões de litros de tequila produzidos anualmente, os mexicanos conseguem levantar receitas que correspondem a cerca de 50% das obtidas pelo etanol no Brasil, com um volume de 15 bilhões de litros. Curiosamente, enquanto no México só se aproveita a pinha do agave, onde está concentrado o açúcar, no Brasil são usadas apenas as fibras das folhas. Cada país joga fora todo o restante da planta. “Nossa ideia é uma biorefinaria para usar tudo. O Don Chambers, que teve essa ideia lá atrás, viu que o México não se interessava, levou para a Austrália, que também não se interessou. Mas talvez se interesse agora, quando nós começamos a fazer”, diz Pereira.

Gonçalo Pereira – Coordenador do Laboratório de Genômica e Bioenergia da Unicamp.

Captura de carbono despertou interesse da Shell

Filho de sertanejo, Pereira, se empolga com as possibilidades do agave para o semiárido brasileiro. “O sertão tem 108 milhões de hectares, o que corresponde a mais de duas vezes uma Alemanha e ainda uma Grécia. É muita área. O problema do sertão é a instabilidade. Você planta milho e não sabe se vai colher. O agave faz a captura da água. Tem meio litro por folha. E faz ainda uma captura gigantesca de CO2, são 385,4 toneladas por hectare. Por isso o grande interesse da Shell. A gente pode substituir o petróleo pela fotossíntese”, sublinha Pereira. Em tese, devido ao alto rendimento, com 3,3 milhões de hectares de agave seria possível produzir todo o volume de etanol do mercado brasileiro, ou 30 bilhões de litros. Enquanto com a cana, para o mesmo resultado, são necessários 4,5 milhões de hectares cultivados.

Executivos da Shell no país projetam um cultivo de até 2 milhões de hectares no semiárido (menos de 2% da área total do bioma), suficiente para produzir de 6 bilhões a 10 bilhões de litros de etanol de agave por ano. Assim, não haveria sequer pressão sobre as áreas de caatinga destinadas à preservação. “Ela pode ser plantada onde a cana não sobreviveria. E em áreas em que não traz impacto ambiental, porque são áreas que já tiveram algum tipo de agricultura, e que, hoje, devido a problemas hídricos, são subutilizadas, sem mata nativa, sem plantação alguma. O grande potencial estratégico é trazer uma matriz industrial para uma região que hoje não tem nada parecido”, diz o coordenador do projeto Brave na Shell, Marcelo Medeiros.

*Gazeta do Povo

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