Paredes rochosas silenciosas, testemunhas de um passado ressonante. Essa é uma descrição da trilha na localidade conhecida como Mariza, em Tucano, na região sisaleira da Bahia, onde o historiador André Carvalho encontrou um tesouro arqueológico no da 10 de agosto. Ele fez a descoberta de um conjunto de gravuras rupestres que promete revelar novos aspectos das civilizações antigas que habitaram a área. O autor da descoberta é André Carvalho, o mesmo historiador e mestre em História pela Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs). A descoberta das gravuras ocorreu por acaso, em uma área de difícil acesso, sugerindo que o local permaneceu inexplorado até o momento. Em entrevista ao Bahia Notícias, o historiador contou que a descoberta ocorreu durante trilhas realizadas para o programa ‘Panela de Bairro’, juntamente com um casal, para explorar pontos turísticos locais. No começo, André suspeitou de marcas que os turistas fazem na trilha: “Eu andava ali e notei que as pessoas riscam os nomes nas paredes. A gente começou uma brincadeira, começou a dar uma olhada nos riscos das paredes, pedras e rochas. Comentamos que esses nomes poderiam ser gravuras rupestres.” Na segunda vez que André retornou à trilha sozinho, um evento inesperado levou à descoberta das gravuras. Enquanto andava pela trilha, “Um boi da fazenda próxima pulou a cerca e fugiu, de repente o dono saiu atrás desse boi. Eu entrei na fazenda que o rapaz deixou aberto, tinha um paredão e uma rocha por trás. Quando eu olhei para cima, comecei a ver uns rastros,” relatou André. As gravuras foram encontradas em uma área de difícil acesso, sugerindo que o local permaneceu inexplorado até o momento. “A localização remota das gravuras pode ter contribuído para sua preservação ao longo dos séculos,” comentou André Carvalho. Após documentar as gravuras com fotografias detalhadas, ele encaminhou as imagens para dois colegas arqueólogos, que confirmaram a autenticidade das obras. Ele detalhou como percebeu que os sinais não eram recentes: “Comecei a olhar se tinha alguns sinais recentes, procurando vi que não tinha nenhuma letra. E pensei, pera aí, isso não é recente não. Apenas símbolos e riscos, e aí eu fotografei.” André enviou as fotos para nossa equipe do Bahia Notícias.
Imagens dos registros arqueológicos encontrados na região | Foto: Reprodução / André Carvalho
Reconhecendo a importância histórica e cultural da descoberta, André abriu um protocolo junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). “O objetivo é garantir a preservação das gravuras e viabilizar estudos mais aprofundados,” explicou André. A iniciativa visa proteger o sítio arqueológico e permitir que especialistas analisem o contexto histórico das gravuras. Nossa equipe solicitou a Carlos Alberto Etchevarne, arqueólogo e professor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), que analisasse as fotografias. Ele é autor da obra premiada “Escrito na Pedra: Cor, Forma e Movimento nos Grafismos Rupestres da Bahia,” e confirmou serem gravuras rupestres.
Movimentos de tridígitos, semelhantes a ‘garras’ registrados no local | Foto: Reprodução/ André Carvalho
Em entrevista ao Bahia Notícias, Etchevarne explicou: “As fotos que enviou são de tridígitos, motivos gráficos muito recorrentes na Bahia e em outras partes do Brasil.” O arqueólogo também ressaltou a importância da descoberta para o local: “Gravuras como essas atraem turismo para a região. A ideia é sempre conversar e instruir os moradores locais sobre como usar esses sítios.” O historiador André Carvalho defende a necessidade de apoio institucional para a preservação das gravuras: “É preciso que eu consiga um parecer do Iphan. Não sou um pesquisador da área. Busco no Iphan mais informações e um parecer técnico na prefeitura local. Temos que dialogar com órgãos públicos, mas também com a comunidade. Precisamos levar ao proprietário a informação sobre a existência das gravuras para fazer um acordo com ele para a preservação da região. São terras particulares. Trazer as secretarias de Comunicação e Cultura da prefeitura para realizar o andamento. O Iphan pode ser uma ferramenta importante na história.” No entanto, o Bahia Notícias obteve acesso exclusivo ao protocolo n.º 72020.001903/2024-66, que revelou atrasos no atendimento devido à revisão e adequação técnica da linguagem. A Ouvidoria-Geral do Iphan comunicou a prorrogação do prazo de atendimento para 12/10/2024, destacando a necessidade de uma resposta mais técnica e adequada. Durante a entrevista, o professor da Ufba enfatizou ainda que há uma carência de recursos e profissionais nos órgãos de preservação. “Porque também é assim, não temos órgãos de preservação, temos dois órgãos de preservação. Iphan nacional e IPAC estadual. Nenhum dos dois tem condições técnicas, de recursos, de profissionais, para segurar a quantidade de sítios arqueológicos da Bahia,” afirmou o professor. As gravuras rupestres de Tucano têm o potencial de enriquecer o conhecimento sobre as antigas civilizações que habitaram a Bahia. A fazenda com os registros fica a quase 20 km da distância da cidade, e o município tem uma rica história e localização estratégica, sempre foi um ponto de interesse com passagens de grupos como de Antonio conselheiro no fim do século XIX e com o ataque de Lampião em 1930.
Imagem de ‘Arte Rupestre’ descoberta no Morro de Chapéu e das ‘Gravuras rupestres’ de Tucano | Foto: Divulgação / Júlio Mello de Oliveira
Vale lembrar que a região é conhecida por sua relevância na rota dos tropeiros e por ser um local de interseção cultural entre diferentes povos ao longo dos séculos. “Essa descoberta não só amplia nossa compreensão sobre os povos que viveram aqui, mas também destaca a importância da preservação do nosso patrimônio cultural,” afirmou André. Para André, o achado pode atrair turistas interessados em história, beneficiando a economia local e promovendo a cultura da região. Disso, nem o professor Echevarne discorda: “O turismo promove e provoca uma visitação muito importante e muito seletiva, não sendo de massa. É de alguém que se interessa. Acho que é essencial garantir uma boa gestão.” Ao longo de sua carreira, o arquélogo Etchevarne realizou a descoberta e produziu um estudo das expressões gráficas rupestres na Chapada Diamantina, particularmente em Morro do Chapéu, onde identificou sítios pertencentes ao estilo Serra da Capivara da Tradição Nordeste, contribuindo significativamente para a arqueologia brasileira. Para Etchevarne, segundo sua experiência, é essencial ressaltar a importância do envolvimento da comunidade local: “A ideia é sempre conversar e instruir os moradores locais sobre como usar esses sítios para criar movimentação econômica local.” O autor da descoberta acrescenta que isso pode ser não somente um registro de um passado distante, mas também uma maneira de ensinar sobre a história local: “A gente tem muito potencial. É um distrito turístico que possui águas termais, perfurados nas décadas de 40 e 60 pela Petrobras, encontrando lençóis freáticos que acabaram dinamizando a região. Podemos incrementar o turismo com as pinturas rupestres e as passagens de Lampião. Vislumbro que podemos explorar essa história, construindo um percurso que vai desde as pinturas rupestres até a trilha do cangaço.” O professor Etchevarne relembra o potencial turístico de ser gerido e destinado sempre com os locais: “Não se pode fazer nada sem convencer os moradores ao redor dos sítios.” Retomando a importância do envolvimento da comunidade local: “Gravuras como essas atraem turismo para a região. A ideia é sempre conversar e instruir os moradores locais sobre como usar esses sítios. Não se pode fazer nada sem convencer os moradores ao redor dos sítios. Nada. Eles definem as prioridades e facilidades de lidar com isso”, conclui o professor. André Carvalho planejou compartilhar a descoberta com o Bahia Notícias e segue enfatizando a relevância das gravuras para a história regional. “Espero que essa pauta desperte o interesse do público e incentive a preservação do nosso patrimônio histórico”, completou. A descoberta na fazenda local sugere um novo entendimento sobre a Bahia, evidenciando a necessidade de um trabalho mais aprofundado de pesquisa de campo. A equipe de reportagem do Bahia Notícias contatou o Iphan em relação ao protocolo, mas não obteve resposta.
Bahia Notícias*